sábado, 2 de janeiro de 2010

Tudo na minha pele vira cicatriz

Picture me: estou sentada num colchão no chão de um apartamento duplex praticamente novo em Caldas Novas. Os fones de ouvido tocam essa música que não sei se descrevem melhor a mim ou à mulher da minha vida. E os meus pensamentos são de quem eu sou, de como eu sou. São sobre o que me construiu durante toda a minha vida, até esse específico momento da minha existência, sentada nesse colchão.
Clarice Lispector bem escreveu em "minhas queridas" que até cortar os defeitos pode ser perigoso - nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro. A partir disso eu penso no quanto eu fui podada e me podei por diversas razões. Eu penso no que eu poderia ser hoje se eu não tivesse dito não naquela específica vez em que me perguntaram o que eu queria, se eu tivesse respondido diferente sobre qual rumo tomar. Às vezes eu penso naqueles incidentes de criança, sabe? Na rotina na qual eu fui criada desde o primeiro momento em que eu respirei, na definição inflexível do que me ensinaram sobre o que era certo e errado. E penso na aceitação cega que eu alimentei até hoje. Eu não quero ser alguém que não sabe da razão de ser. Mas quem é que sabe?
Acho que é por isso que eu sou indecisa. Talvez eu esteja secretamente tentando me livrar da culpa de ter tomado a decisão errada, talvez eu esteja evitando a verdade de que abdicar o direito de tomar as próprias decisões é ainda pior do que errar.
Não viver é ainda pior do que ter cicatrizes.