Há tempos meu quarto não via a luz do sol, os raios brancos de luz refletidos no lago que batem na minha janela por longas horas no dia. Há tempos meu quarto só via a escuridão, espalhada pela parede, deitada na cama, acariciando todos os objetos, os meus objetos, os meus livros, os meus lápis de cores. Os dezenove anos que acumulei.
Hoje o quarto viu muito sol, logo pela manhã. E aos poucos eu fui tendo o impulso de esconder tudo dentro dos armários e proteger tudo que é meu dessa sensação estranha de calor. de carinho. Tudo foi limpo com os produtos mais cheirosos. Tudo foi colocado convenientemente em seu próprio espaço confortavelmente escuro dentro das gavetas. As paredes rosas brilhavam, os móveis vazios respiravam finalmente depois de tanto tempo cobertos pela minha carga. Se via as almofadas, se via a estampa da cômoda, se via a cor da bancada. Não me via.
Não havia eu mesma em lugar algum do meu próprio quarto. Não havia nada sobre a minha vida no meu próprio abrigo.
Eu achei que por ir embora eu gostaria de me despedir do que eu sou aqui, do que sou hoje. Do que sou. Mas eu me enganei.
Os lápis de cores voltam, a aquarela da bancada também. As fotos na parede, as tranqueiras nos espaços vazios, as miniaturas, os livros, as brochuras, as lembranças. Tudo é meu. Tudo sou eu. E quando eu voltar eu quero me sentir aqui de novo.
Não vou ficar pra sempre em Barcelona.
Eu estou indo pra voltar.
Há 2 anos